quarta-feira, 21 de março de 2012

Anistia de Mão Dupla

Anistia de mão dupla foi o preço da volta à democracia
Entrevista concedida por Miguel Reali Junior ao jornalista Roldão Arruda, publicada no “Estado de S. Paulo” em 18.03.2012.

Como o sr. vê o texto da denúncia contra o major Curió, acusado de crimes na guerrilha do Araguaia?

O documento é importante do ponto de vista histórico, porque faz um relato preciso das circunstâncias das prisões e narra com detalhes o que aconteceu. Sob o aspecto jurídico, porém, o valor é nulo.

Por que o sr. destaca o valor histórico da denúncia?

Fui presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos por um período de cinco anos. No trabalho à frente dessa comissão, criada pela Lei 9.140 de 1995, foi extremamente chocante ouvir os relatos sobre os desaparecidos, especialmente os casos dos torturados nas delegacias, nos porões da ditadura. Por isso considero importante essa denúncia.

E por que não vê valor jurídico no documento?

A Lei 9.140, que criou a comissão, estabelece em seu primeiro artigo que se reconhece, para todos os efeitos legais, a morte das pessoas desaparecidas. Foi em decorrência dessa determinação que houve a emissão de certidões de óbito pelos cartórios e a abertura de processos de sucessão, que eram reivindicações dos familiares. Diante disso, fica absolutamente sem sentido estabelecer agora que os desaparecidos continuam vivos. Como sustentar uma coisa dessas, se eles são declarados mortos pela lei e se não existe nenhum elemento probatório de que estão vivos? Não há um mínimo indício, nada que permita processar os autores dessas prisões por sequestro - e não por homicídio, como se pretende agora.

Os desaparecidos estavam sob a guarda dos militares.

Eles faziam parte da guerrilha e as eventuais prisões que ocorreram colocavam-se dentro do nível da legalidade. O ilegal, evidentemente, seria torturá-los e matá-los. Portanto, se alguém fosse encaminhar um processo criminal, se tivesse elementos para isso, seria em relação a tortura e homicídio - jamais por sequestro. Mas o primeiro contrassenso nesse debate, insuperável, é esse ao qual já me referi: os desaparecidos foram legalmente declarados mortos. Como é que podem ser reconhecidos como mortos para outros efeitos, como sucessão familiar, mas não para esta denúncia? É uma temeridade.

Os corpos não foram encontrados. Não é crime permanente?

O sequestro é um crime que existe no momento da ação, quando se pega alguém, com abuso de autoridade, e suprime sua liberdade, impedindo que saia do cárcere. Onde é que existe algum indício, alguma ação que demonstre que, ao longo desse período de quase 40 anos, essas pessoas foram impedidas de recuperar a liberdade e continuam encarceradas? Como se pode provar a participação do Sebastião Curió para impedir, nesse tempo todo, a liberdade dessas pessoas, que estão presumivelmente mortas?

Isso não seria uma brecha na Lei da Anistia para finalmente punir os autores dos crimes?

Isso é mais do que uma elucubração jurídica: é uma criação. O processo penal não funciona assim. Ele precisa de fatos, não de hipóteses que venham satisfazer a necessidade de punir alguém. Eu também gostaria que o Curió e outros que participaram de atividades repressoras tivessem a sua punição. Mas não podemos fazer isso porque temos, em primeiro lugar, uma impossibilidade jurídica. Dar andamento a essa ideia significaria criar uma imensa insegurança jurídica. Não tenho dúvida de que a absoluta falta de justa causa para a propositura dessa ação vai demonstrar que se pode brincar com o direito, que se pode fazer denúncias infundadas. Em vez de beneficiar a causa do repúdio a esses atos, ela acaba sendo maléfica.

O sr. falou das prisões no Araguaia. E os casos ocorridos em outros lugares?

Todos os casos estão sob o manto da Lei da Anistia de 1979. E não se pode falar em sequestro e crime continuado, porque ninguém ficou sequestrado. Com o fim do AI-5 e o início do governo de Tancredo Neves e José Sarney, ninguém mais ficou encarcerado por crime político.

A lei é criticada por ter sido promulgada sob o regime militar.

Na época eu fazia parte do Conselho Federal da OAB. Nós lutamos por essa lei, porque era uma forma de trazer um pouco de paz política e social ao País. Várias pessoas que estavam presas, refugiadas e exiladas puderam voltar ao Brasil e reiniciar suas atividades políticas. Foi o início de um processo de pacificação para se passar ao regime efetivamente democrático. Não se pode negar que a lei constituiu um benefício político e democrático para o Brasil.

Critica-se o fato de ter sido uma anistia de mão dupla.

Foi sim um processo de mão dupla, que também anistiou aqueles que praticaram tortura, que é um crime contra a humanidade. Ao mesmo tempo, porém, do ponto de vista interno, da política brasileira, foi o momento da volta dos cassados aos cargos públicos, dos professores às atividades universitárias, da organização dos partidos. Foi um preço alto? Foi. Mas foi o preço para trazer a paz política e social para o Brasil. Mais tarde, é preciso lembrar, essa anistia foi legitimada pela emenda constitucional que convocou a Assembleia Constituinte. O tema também já passou pelo Supremo Tribunal, que o analisou profundamente. Não se pode fazer tábula rasa de tudo isso, porque o resultado leva a uma profunda insegurança jurídica.

Representantes da ONU apoiaram a iniciativa do MPF.

É uma contradição falar em proteção dos direitos humanos sem o respeito aos princípios básicos do Estado democrático. Forçar uma interpretação, que permita moldar o que aconteceu a um determinado tipo penal, é um desrespeito aos princípios básicos do direito. Por mais justo que seja o desejo de punir as pessoas que praticaram atos violentos à época da ditadura militar, nada justifica o abandono de princípios nos quais está fundamentado nosso pensamento. Não pode se garantir direitos humanos a uns e negar a outros.

Como vê a pressão dos organismos internacionais sobre o País?

É uma pressão que se faz com base em tratados e documentos que o País assinou depois da Lei da Anistia. Eles devem ser executados no nosso dia a dia, mas querer retroagir e forçar a adequação de acontecimentos é o mesmo que colocar o desejo acima dos princípios.

E a Comissão da Verdade?

É um ponto altamente positivo porque não há direito ao esquecimento. Os fatos devem ser divulgados e ensinados às novas gerações. O que não existe é o direito à perseguição penal.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Dados grávidos

José Roberto de Toledo
11.março.2012 22:33:48
– Como empresas e políticos sabem mais de você do que você mesmo
Nos EUA, um pai ficou indignado ao encontrar, na sua caixa de correio, cupons de desconto para roupas de bebê enviados por uma cadeia de varejo em nome de sua filha menor de idade. Acusou a loja de tentar induzir a garota a ser mãe precocemente. Mas, após confrontar a adolescente, descobriu que a filha já estava grávida. Só ele não sabia.

Os estatísticos da loja de departamentos Target não tiveram acesso a nenhum teste de gravidez. Apenas inferiram que aquela consumidora iria dar à luz cruzando informações de compras: a mudança no seu padrão de consumo era consistente com o de outras grávidas. Foram tão precisos quanto um exame de ultrassom.

A história -quase boa demais para ser verdade- ilustra reportagem do “New York Times” intitulada “Como companhias aprendem os seus segredos”. A rigor, não são dos segredos de uma pessoa, mas dos hábitos da multidão que as empresas estão atrás. Juntando os seus aos meus, descobrem os nossos. Tudo para determinar padrões e prever comportamentos. No conjunto, somos muito mais parecidos uns com os outros do que gostamos de admitir.

Na reportagem, analistas da Target revelaram, orgulhosos, como são capazes de prever, com pequena margem de erro, a data do parto ou o sexo da criança. Tudo com base no consumo de loção de pele, na quantidade de tufos de algodão comprados e na cor do tapete encomendado para o quarto do bebê. Esses itens fazem parte de uma cesta de 25 produtos que compõem o “índice de predição de gravidez” criado pela loja. Não é piada, é dinheiro.

Você pode achar que ninguém está prestando muita atenção em como usa seu cartão de crédito, no que faz com seu mouse e com seu celular ou por onde você anda com seu carro, mas isso não muda o fato de que há gente cuja missão profissional é colecionar, organizar e analisar dados sobre você. É íntimo, mas não é pessoal: é universal.

No mundo do chamado “Big Data”, o nome importa menos que o CPF, que o endereço eletrônico ou que o número do cartão de crédito. Importante é juntar dados sobre a maior massa possível de consumidores, contribuintes, motoristas e internautas. Não para espioná-los -em princípio-, mas para transformar cada um deles num código numérico unificado. Afinal, há menos algarismos do que letras, o que agiliza a computação.

Há cada vez melhores aplicativos para reconciliar bilhões de dados de diferentes origens com o objetivo de determinar que o dono do CPF “tal” é também a pessoa por trás daquele email, deste cartão de crédito, de certo endereço I.P. e -por que não?- de um determinado título de eleitor.

Na caça ao seu voto, políticos fazem “microtargeting”. O site Pro Publica relatou como um casal norte-americano recebeu ao mesmo tempo, enquanto ambos assistiam TV no sofá, duas mensagens diferentes do comitê de campanha de Barack Obama em seus celulares. Com palavras e argumentos diversos, elas pediam a mesma coisa: dinheiro. O site descobriu pelo menos seis versões diferentes da mesma mensagem disparadas para os celulares de possíveis apoiadores do presidente dos EUA.

A diferenciação da forma se deve a diferentes estratégias elaboradas pelos marqueteiros de Obama para diferentes perfis de eleitor. A meta é evocar o tema que mais interessa a cada um, no momento certo e do jeito que, imaginam, tornará o apelo mais sedutor -do mesmo jeito que a Target manda cupons de desconto de roupas de bebê para adolescentes grávidas pouco antes de elas darem à luz, em vez de enviar para seus pais indignados.

Enquanto isso, a Casa Branca tenta regular a fome de dados das empresas. Propôs a lei de direitos de privacidade do consumidor. O texto prevê transparência por parte das empresas, controle individual dos consumidores sobre suas informações e limites ao uso dos dados. Mas, como os emails de campanha demonstram, o próprio Obama pratica microtargeting.

No Brasil, essa técnica foi usada em campanhas de presidente e governador, em 2010. Apesar da carência de dados -quando comparadas às bases de dados dos EUA, onde o marqueteiro conhece centenas de características de cada eleitor-, estrategistas de Marina Silva e Sergio Cabral, por exemplo, conseguiram “fatiar” o eleitorado e desenvolver um tipo de campanha para cada segmento, de acordo com seus interesses e prioridades.

É algo que está fazendo falta ao governo federal. Não só para avaliar políticas públicas com eficiência, mas para mirar com precisão os interesses de cada parlamentar da chamada base aliada. Sem esse controle fino, o Planalto corre o risco de, como o pai daquela adolescente grávida, ser o último a saber das estripulias de seus afilhados no Congresso.

quinta-feira, 8 de março de 2012

MULHER

No dia internacional da mulher uma palavra:sem você mulher, não somos nada!

Pronta na cabeça.

Blog de Augusto Nunes

Nem faz tanto tempo assim que os brasileiros achavam impossível saber o que há dentro de barriga de grávida, urna eleitoral e cabeça de juiz. Os dois primeiros enigmas caducaram com os avanços ocorridos na medicina e na estatística: há muitos anos ninguém precisa aguardar o parto para descobrir se é menino ou menino, e os resultados da eleição são antecipados por pesquisas de boca-de-urna. O terceiro mistério durou um pouco mais. Vai sendo aposentado pela revogação do princípio segundo o qual juízes só falam nos autos.
A remoção desses limites tem ocorrido em todas as instâncias, mas os campeões da loquacidade jogam na seleção da toga. Os ministros do Supremo Tribunal Federal falam fora dos autos, cada vez mais, em entrevistas à imprensa e nas sessões transmitidas pela TV Justiça. Basta ouvir ou ler o que dizem, frequentemente aos berros, para descobrir o que há dentro de cada cabeça ─ e enxergar não só a decisão já tomada como os motivos que condicionaram sua gestação.
Até os cabides das togas sabem, por exemplo, que o ministro Ricardo Lewandowski (à direita, de pé, na foto) já decidiu o que fará no julgamento do mensalão. No papel de revisor do processo, vai absolver ─ “por falta de provas” ─ as estrelas do elenco formado por 38 envolvidos no maior escândalo federal registrado desde o Descobrimento. E aplicará penas brandas aos figurantes se as circunstâncias lhe soprarem que é arriscado inocentar a turma inteira. Pescar alevinos é uma boa maneira de livrar do anzol peixes graúdos.
Se depender de Lewandowski, portanto, será preservado o direito de ir e vir de gente como José Dirceu, acusado de chefiar a quadrilha formada por figurões do governo e empresários amigos. Ou José Genoíno, que presidia o PT quando o partido virou quadrilha e hoje ajuda Celso Amorim a comandar o Ministério da Defesa. Ou mesmo Delúbio Soares, reabilitado pela companheirada e condecorado por Lula com a medalha de Vítima da Grande Conspiração da Elite Golpista.
Se já decidiu como votar, perguntarão os brasileiros de boa fé, o que espera o doutor para concluir o palavrório que teve de começar a redigir há três meses? Lewandowski não desistiu de empurrar o caso até 2013, sonho revelado em dezembro numa entrevista a Fernando Rodrigues, da Folha. Tal adiamento permitiria que, antes do julgamento dos mensaleiros, viesse a aposentadoria compulsória de dois ministros que parecem muito menos compassivos com pecadores sem remédio.
A lei faculta a Lewandowski o direito de fazer o que lhe der na telha e errar como quiser. Pode, portanto, enxergar um cidadão exemplar por trás do bandido de pai e mãe. Mas não pode recorrer a truques e espertezas para protelar o julgamento dos envolvidos na roubalheira infame ─ e impedir que dois ministros interessados em fazer justiça também exerçam o direito de votar livremente. Cumpre a Cezar Peluso, presidente do STF, informar ao retardatário por opção que os demais ministros querem julgar o caso ainda neste semestre.
Lewandowski faz de conta que anda absorvido pela tarefa de rabiscar justificativas para o voto injustificável. É hora de exigir que termine oficialmente o serviço que está pronto na cabeça desde o dia em que foi encomendado.

terça-feira, 6 de março de 2012

A maior grilagem acabou A maior grilagem acabou A maior grilagem acabou A MAIOR GRILAGEM ACABOU.

Lúcio Flávio Pinto
Articulista de O Estado do Tapajos

Nesta semana a subseção da justiça federal de Altamira, no Pará, vai receber os autos do processo sobre a maior grilagem de terras da história do Brasil, talvez do mundo. São quase 1.500 páginas de documentos, distribuídos em seis volumes, que provam a forma ilícita adotada por um dos homens mais ricos e poderosos do Brasil contemporâneo para se apossar de uma área de 4,7 milhões de hectares no vale do rio Xingu.

Se a grilagem tivesse dado certo, Cecílio do Rego Almeida se tornaria dono de um território enorme o suficiente para equivaler ao 21º maior Estado do Brasil. Com seus rios, matas, minérios, solos e tudo mais, numa das regiões mais ricas em recursos naturais da Amazônia.

O grileiro morreu em março de 2008, no Paraná, aos 78 anos, mas suas pretensões foram transmitidas aos herdeiros e sucessores. A "Ceciliolândia", se pudesse ser contabilizada legalmente em nome da corporação, centrada na Construtora C. R. Almeida, multiplicaria o valor dos seus ativos, calculados em cinco bilhões de reais.

Com base nas provas juntadas aos autos, em 25 de outubro do ano passado o juiz substituto da 9ª vara da justiça federal em Belém mandou cancelar a matrícula desse verdadeiro país, que constava dos assentamentos do cartório imobiliário de Altamira em nome da Gleba Curuá ou Fazenda Curuá.

O juiz Hugo Sinvaldo Silva da Gama Filho reconheceu que os direitos conferidos por aquele registro eram nulos, "em razão de todas as irregularidades que demonstram a existência de fraude no tamanho da sua extensão, bem como a inexistência de título aquisitivo legítimo".

Além de mandar cancelar a matrícula do imóvel, o juiz ordenou "a devolução da posse às comunidades indígenas nas áreas de reserva indígena que encontram-se habitadas por não-índios". Condenou a empresa ao pagamento das custas processuais e da verba honorária, que fixou em 10 mil reais.

No dia 9 de dezembro a sentença foi publicada pela versão eletrônica do Diário da Justiça Federal da 1ª Região, com sede em Belém e jurisdição sobre todo o Pará, o segundo maior Estado brasileiro. No último dia 15 de fevereiro os autos do processo foram devolvidos à subseção federal de Altamira, em cumprimento à portaria, baixada em novembro do ano passado.

A portaria determinou "que a competência em matéria ambiental e agrária deve se limitar apenas aos municípios que integram a jurisdição da sede da correspondente Seção Judiciária".

É provável que a única intervenção do juiz de Altamira se restrinja a extinguir a ação e arquivar o processo. Tudo indica que a Incenxil, uma das firmas de que Cecílio Almeida se valia para agir, não recorreu da decisão do juiz Hugo da Gama Filho. Ou por perda do prazo, que já foi vencido, ou porque desistiu de tentar manter em seu poder terras comprovadamente usurpadas do patrimônio público através da fraude conhecida por grilagem.

A sentença confirma o que reiteradas vezes declarei nesta coluna e no meu Jornal Pessoal: Cecílio do Rego Almeida era o maior grileiro do Brasil — e talvez do mundo — até morrer. E até, finalmente, perder a causa espúria. Por ter dito esta verdade, reconhecida pela justiça federal, a justiça do Estado me condenou a indenizar o grileiro.

A condenação original foi dada por um juiz substituto, que fraudou o processo para poder juntar a sua sentença, quando legalmente já não podia fazê-lo. Essa decisão foi mantida nas diversas instâncias do poder judiciário paraense, mesmo quando a definição de mérito sobre a grilagem foi deslocada (e em boa hora) para a competência absoluta da justiça federal.

Se a Incenxil não recorreu, a grilagem que resultou na enorme Fazenda Curuá foi desfeita. Mas essa decisão não se transmitiu para o meu caso, o único dos denunciantes da grilagem (e, provavelmente, o único que mantém viva essa denúncia) a ser condenado.

Em um livro-relâmpago que estou lançando em Belém junto com uma edição especial do Jornal Pessoal, reconstituo a trama urdida para me levar a essa condenação e me tirar do caminho do grileiro e dos seus cúmplices de toga.

Como vítima de uma verdadeira conspiração entre empresários, advogados e membros do poder judiciário, considero a minha condenação um ato político. Seu objetivo era me calar.

Mas calar não só aquele que denuncia a grilagem e a exploração ilícita (ou irracional) dos recursos naturais do Pará (e da Amazônia). É também para punir quem acompanha com muita atenção a atuação da justiça e a crítica abertamente quando ela erra, de caso pensado. E tem errado muito.

As atuais dificuldades enfrentadas pela ministra Eliana Calmon, corregedora do CNJ, têm origem numa barbaridade cometida por uma juíza paraense e confirmada por uma desembargadora. No mês passado a juíza foi promovida a desembargadora, a despeito de estar passível de punição pelo Conselho Nacional de Justiça.

Decidi tirar uma edição exclusivamente dedicada ao meu caso não para me defender, mas para atacar. Não um ataque de retaliação pessoal, mas uma reação da opinião pública contra os "bandidos de toga", que usam o aparato (e a aparência) da justiça para atingir alvos que só a eles interessa.

Também contra os que se disfarçam de julgadores para agir como partes; que recorrem aos seus poderosos instrumentos para afastar todas as formas de controle que a sociedade pode exercer sobre os seus atos.

Por isso decidi não recorrer da condenação que me foi imposta e conclamar o povo a participar de uma campanha pela limpeza do poder judiciário do Pará. Nossa força é moral. E ela deriva do fato de que temos a verdade ao nosso lado.

A verdade é a nossa arma de combate. Com ela iremos ao tribunal, no dia em que ele executar a sentença infame contra mim, para apontar-lhe a responsabilidade que tem. Não satisfeito em defender os interesses do saqueador, do pirata fundiário, ainda nos obriga a ressarci-lo porque a verdade causa dano moral ao grileiro.

Que moral é essa? A dos lobos, que predomina quando é instituída a lei da selva. Sob sua vigência, vence o mais forte. O resultado é essa selvageria, que se manifesta de tantas e tão distintas formas, sem que nos apercebamos da sua origem.

Frequentemente ela está no poder judiciário, o menos visível e com menos controle social de todos os três poderes estabelecidos na constituição. Esse poder absoluto precisa
acabar.

Para que, com ele, acabe um dos seus males maiores: a impunidade. Queremos um Pará melhor do que esta selvageria em que o estão transformando.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Lista dos Inelegiveis

Publicado pelo Blog do Parsifal 3

Tenho visto comentários sobre a lista dos ordenadores de despesas públicas que tiveram contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PA), referindo-se à relação como “a lista dos inelegíveis”.

O termo “lista dos inelegíveis” não está tecnicamente correto: os tribunais de contas não publicam “lista de inelegíveis” e sim a relação dos ordenadores que tiveram a suas contas julgadas irregulares. Isto por si só não remete o ordenador à condição de inelegível.

> Requisitos para que a rejeição da conta remeta à inelegibilidade

Para que a rejeição de uma conta remeta à inelegibilidade (agora estendida para 8 anos pela Lei da Ficha Limpa) é necessário que a irregularidade encontrada seja insanável e o ato cometido tenha sido doloso (o agente que o praticou tenha tido a intenção de obter resultado ímprobo).

> Quem declara inelegibilidade em caso de conta irregular é a Justiça Eleitoral

Nesta específica seara somente o Poder Judiciário, no caso de pedido de registros de candidaturas a Justiça Eleitoral, pode dirimir a cláusula de inelegibilidade se ela for arguida.

O fato de ler em uma relação do TCE-PA o nome de um ordenador que teve contas julgadas irregulares não autoriza, a bem da cautela, afirmar que ele está inelegível: ele pode demonstrar, em sede de pedido de registro, que a rejeição da conta não se deu por irregularidade insanável e nem o ato que a gerou foi doloso.

> Lei da Ficha Limpa: inelegibilidade objetiva

De diversa forma incorrem aqueles que foram condenados por um colegiado (colegiado, para os efeitos da Lei da Ficha Limpa, refere-se aos órgãos judicantes do Poder Judiciário que se compõem de mais de um juiz. Conselheiros de tribunais de contas não são juízes e suas decisões se regem pela legislação eleitoral específica para efeitos de inelegibilidade). Quem tem uma condenação colegiada, objetivamente está inelegível, não importando os porquês.

> Como ler a relação do TCE-PA de contas julgadas irregulares

Somente a título de efervescência, clique aqui (arquivo em PDF) para ler a relação de ordenadores que tiveram contas julgadas irregulares pelo TCE-PA até 01.2012.

Observe que a lista é cumulativa, ou seja, há ordenadores listados que tiveram contas irregulares transitadas em julgado em 2002 e 2003, portanto, não mais alcançados pela inelegibilidade (8 anos já se passaram).

A relação pode mudar até junho 2012 com a inclusão ou exclusão de nomes ou, como acima referido, o TRE-PA pode deferir registro a quem está relacionado por entender que a irregularidade não foi insanável ou não houve dolo no ato.