sábado, 28 de abril de 2012

Dilma descobriu a seca.

Em ano de eleição, Dilma descobriu a seca Nestes dias, de geléia geral brasileira, nada poderia ter sido mais expressivo – como ato político e fato jornalístico - que a primeira visita do ex-presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, à Brasília, depois do tratamento de câncer na laringe a que se submeteu. A ambientação, preliminares e repercussões da conversa de Lula com a sua sucessora “foi o que há”, expressão que uma sobrinha em Salvador (profissional da publicidade arguta e antenada com os signos do poder e do marketing político) costuma utilizar para definir acontecimentos de grande impacto. Ou que são produzidos com esse objetivo. Tapetes vermelhos (real ou simbolicamente) esparramados no Palácio da Alvorada; sessão especial de cinema, para exibir documentário sobre a posse de Dilma Rousseff; trocas de juras de amor indissolúvel e de fidelidade eterna; risos escancarados, quando em volta tudo (ou quase) gira em ritmo de alta tensão. “Salamaleques!”, resumiria, provavelmente, se vivo estivesse e observasse essas coisas, o escritor alagoano Graciliano Ramos, sábio no pensamento e sempre econômico nas definições. Tudo, coincidentemente (ou não?), no primeiro dia de funcionamento, no Congresso, da chamada CPI Mista do Cachoeira. Portanto, um foco a mais para ser bem observado na capital do Brasil, sobressaltada pelos vivos e os esqueletos que se cruzam, ultimamente a cada instante, na inquieta cidade do planalto central. Denúncias pipocam de todo lado, acompanhadas de “ruídos” e boatos que mais confundem que ajudam a esclarecer sobre “um escândalo que promete abalar Paris”, como se diz em Irecê, no nordeste baiano, assolado, junto com mais de 200 municípios, por mais uma “seca sem precedentes”. A estiagem - assim como a praga corrupta e corruptora de Cachoeira, que contamina a política, governos, imprensa, empresas públicas e privadas - rola solta há mais três anos na Bahia e em outros tantos municípios da região Nordeste. Neste ano de eleições para as prefeituras, coincidentemente (ou não?) a seca ganhou dramáticas cores de tragédia de umas semanas para cá, em meio ao alvoroço da CPI no Congresso. Principalmente depois de outro encontro que merecia ser olhado (e analisado) com mais atenção. Este, ocorrido em Aracaju, nordestina capital sergipana, no começo da semana, entre a presidente Dilma e os governadores da região. Do encontro, além de imagens expressivas no palácio do governo, que lembram pompas de tempos imperiais e de fartura (e não as agruras da seca) resultou o anúncio, com pompa e circunstância, da polêmica “Bolsa Estiagem”, que concederá auxílio de R$ 80, por cinco meses, às famílias residentes nos municípios nordestinos atingidos pela seca”. “Amaldiçoado quem pensar mal dessas coisas”, diriam os franceses. Mas vale lembrar que Luiz Gonzaga e Zé Dantas já alertavam, em “Vozes da Seca”, sobre o tratamento assistencialista (e eleitoreiro) dispensado, pelo governo, nas estiagens dos anos 50, no século passado: “Seu doutor uma esmola, a um homem que é são, ou lhe mata de vergonha, ou vicia o cidadão”. Mas, antes do ponto final, é preciso retornar ao ponto de partida e crucial das linhas deste artigo: o encontro de Dilma com Lula, no retorno do ex-presidente ao Planalto, onde se multiplicam gestos e sinais de harmonia entre os dois, em meio a um território convulsionado. "Nosso relógio é suíço. Jamais ele vai ter de atrasar ou adiantar. Nunca temos de acertar os ponteiros", disse Lula – sem desmentidos ou mesmo um muxoxo de contestação da presidente - em uma das tiradas, bem ao seu estilo, reveladoras de que Lula parece recuperar a velha forma de fazer política e o humor de antes da dolorosa passagem pelo Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. A segunda “tirada de Lula” em Brasília, esta semana, também demonstra a recuperação do velho estilo pernambucano-sindicalista (e petista) de procurar briga. Foi quando ele falou da CPI Mista do Cachoeira, iniciada no dia de seu retorno à capital federal: “Vocês vão se surpreender com o que essa CPI vai revelar”, disse o ex-ocupante da cadeira de Dilma, sem no entanto esclarecer direito quem ele imagina (ou sabe de fato) serão os surpreendidos. Pelo tom, arrisco, parecia decidido a retomar seus antigos embates com a imprensa e com jornalistas. A conferir. Vitor Hugo Soares, jornalista. E-mail:vitor_soares1@terra.com.

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