Em
1975 a hidrelétrica de Tucuruí, a quarta maior do mundo, começou a ser
construída no Pará. Dez anos depois ela foi inaugurada. Foi uma das maiores
obras públicas da história do Brasil, a mais cara da Amazônia. Projetada
inicialmente para custar 2,1 bilhões de dólares, no final seu valor se
multiplicara por cinco, passando de US$ 10 bilhões.
Já a fortuna do
dono da empreiteira principal da obra, a Camargo Corrêa, “apenas” dobrou. Em
1975, Sebastião Camargo tinha uma fortuna pessoal calculada em US$ 500 milhões.
Dez anos depois ele se tornou o primeiro bilionário brasileiro.
A usina
hidrelétrica, que garante 8% de todo consumo de energia do país, com seus quase
200 milhões de habitantes, lhe permitira embolsar meio bilhão de dólares, em
valor não atualizado.
Quando se abriu
a última década do século XX, as listas das revistas americanas Fortune e Forbes
incluíam apenas três bilionários brasileiros: Antonio Ermírio de Moraes, cabeça
da principal família de industriais brasileiros, e Roberto Marinho, imperador
das comunicações com sua Rede Globo de Televisão, além de Camargo.
Ao final do
governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, eram oito. Quando Lula passou o
bastão presidencial à correligionária, Dilma Roussef, a lista passara a 30. No
ano passado chegou a 35. A soma das fortunas individuais desses bilionários
equivalia à metade do que amealhou o homem mais rico do planeta.
Por
coincidência, o mexicano Carlos Slim, que tem na carteira US$ 69 bilhões, é dono
das operadoras de telefonia Claro e Embratel nesse Brasil que se tornou terreno
fértil para imensos ganhos pessoais.
Eike Batista,
com apenas 55 anos, um jovem na companhia de anciãos podres de rico da seleta
confraria, era o cabeça do ranking, em março do ano passado, com seus US$ 34,5
bilhões. Mas ontem seu patrimônio já era de pouco menos da metade, US$ 10,7
bilhões.
Nesse dia 7 ele
perdeu US$ 300 milhões com a queda das ações da principal das suas seis empresas
de capital aberto, sempre com um X no nome, a OGX. Segundo a agência de notícias
americana Bloomberg, ele caiu fora da roda dos 100 homens mais ricos da
Terra.
No curso de um
ano a OGX, perdeu mais de três quartos do seu valor porque sua produção, depois
de tantos anúncios mirabolantes, frustrou todas as expectativas, principalmente
a de Eike. Os analistas mais bondosos justificaram a queda contínua e grande do
patrimônio do empresário atribuindo-a ao seu excesso de otimismo.
Essa exagerada
autoconfiança o teria levado a prever resultados sem base real. Como a de que
passaria o mexicano Slim em 2015. A meta já era difícil de alcançar quando seu
patrimônio era metade da foruna do concorrente. Agora é quase sete vezes
menor.
Com mais
realismo nas suas ações, acreditam esses analistas compreensivos, Eike Batista
retomará a roda da fortuna e voltará ao topo. Ele seria a personificação do
genuíno ricaço dos tempos do novo trabalhismo no poder, personificado pelo
PT.
Ganhou muito
dinheiro por ser um autêntico empreendedor, apostar nas riquezas do país,
arriscar investimentos na produção e ter uma visão mais ampla e sensível da
atividade empresarial. Um bilionário do bem, conforme o jargão maniqueísta dos
nossos tempos de retórica de camuflagem. Embora uma das duas empresas que atuam
no porto de Açu, a LLX, tenha sido acusada pelo governo do Rio de Janeiro de
causar danos ao meio ambiente. E multada.
Por trás da
pantomima do marketing, verifica-se que o sucesso começa com boas – ou mesmo
privilegiadas, no sentido estritamente técnico da expressão – informações, a
maior parte delas proveniente do aparato estatal.
É também na
administração pública que esses empreendedores (na Rússia mais diretamente
conhecidos por “barões ladrões”, com ênfase nos produtores de petróleo do Mar
Cáspio, o equivalente do Pré-Sal dos Eikes Batistas et caterva neste país
varonil) vão buscar seus quadros de gestão.
Duplo uso de
informações privilegiadas, pois.
No caso de Eike,
com a decisiva participação do pai, Eliezer Batista, ex-ministro de vários
governos e presidente da ex-estatal Companhia Vale do Rio Doce, artífice de
grandes investimentos públicos em logística, infraestrutura e produção,
sobretudo de commodities.
A ascensão
súbita e exponencial desses ricaços, quando se confronta seus ganhos através da
manipulação de papéis com o balanço real de seu ingresso no processo produtivo,
expressa uma nova modalidade de associação entre o governo e a iniciativa
privada.
Quando se puxa o
novelo da trajetória dessas pessoas, quase sempre se chega ao ente estatal. Mas
agora com novo discurso, reforçado pelos números de programas assistenciais e de
“inclusão social”, que permitiram a milhões de famílias sair da faixa da miséria
ou formar um novo tipo de “classe média”, montada não sobre poupança real, mas
graças a um endividamento perigoso, precário, uma faca só lâmina, como diria o
poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto.
Tudo muda para
tudo ficar igual. Ao mesmo tempo em que Eike Batista era despejado do
arrolamento nobre dos homens mais ricos do planeta, a viúva de Sebastião
Camargo, Dirce, pulava à frente do banqueiro Joseph Safra, tornando-se a
terceira maior bilionária brasileira.
Dirce? Mas quem
é Dirce, devem ter perguntado os atentos leitores do noticiário financeiro. De
fato, a viúva do grande empreiteiro, discreta como o marido, deixara os
holofotes da imprensa.
Mas a Camargo
Corrêa, que ainda hoje, passados quase 40 anos da sua instalação na área,
continua a trabalhar (e faturar) no canteiro de obras de Tucuruí, no rio
Tocantins, certamente um recorde – ao menos nacional.
E funciona a
todo vapor nas novas hidrelétricas de Juruá, no rio Madeira, e de Belo Monte, no
Xingu, esta destinada a ocupar o lugar de Tucuruí no ranking das maiores usinas
do mundo.
No ano passado
essas duas frentes de serviços responderam por 30% dos 17,3 bilhões de
faturamento da empresa. Continuará assim pelos próximos anos, um maná tão
parecido, na administração petista do Brasil, àquele que os governos militares
providenciaram para sua empreiteira favorita. A ditadura virou democracia, mas o
dinheiro é o mesmo, embora avolumado na drenagem para mais bolsos
privilegiados.
A multiplicação
dos bilionários bem que podia ser considerada uma das maiores obras do PAC, o
Programa de Aceleração do Crescimento (de quem mesmo?).