quarta-feira, 13 de junho de 2012

DEU NO JORNAL


TOQUE DE RECOLHER

Dora Kramer
Há convocações e convocações. Na história recente do Brasil a oposição ao regime
 militar levou às ruas milhares para pedir da “anistia ampla, geral e irrestrita” e 
reuniu milhões para exigir eleições “Diretas-Já”.
Anos depois um presidente acuado por denúncias de corrupção foi à TV conclamar
 o povo a sair “vestido de verde-amarelo” em sua defesa e o que viu nos
dias seguintes foi surgir uma mobilização de gente vestida de preto a pedir
 a interrupção de seu mandato.
Qual a diferença entre as duas situações? Em essência, a natureza da causa.
Inevitável pensar nesses dois acontecimentos quando se vê o principal 
réu do processo do mensalão, o ex-ministro e deputado cassado José
 Dirceu, a conclamar estudantes e movimentos sociais a se mobilizar contra 
não se sabe exatamente o quê.
Dirceu não é específico. Pelo tom, pretende que as pessoas se
 mobilizem para pressionar o Supremo Tribunal Federal a inocentá-lo:
 “Todos sabem que esse julgamento é político, essa é uma batalha a ser 
travada nas ruas senão a gente vai ouvir uma só voz, pedindo a condenação
 sem provas. É a voz do monopólio da mídia”.
Pelo texto do discurso dirigido à União da Juventude Socialista reunida em
 seu 16.º congresso, José Dirceu gostaria que seus defensores ficassem “vigilantes” 
para não permitir “um julgamento fora dos autos”. Para garantir que a “Justiça
 cumpra o seu papel” e impedir que o processo se transforme “no julgamento 
de nossa geração”.
Qual geração? A dele, a dos jovens estudantes ou dos dirigentes dos movimentos
 sociais? Primeira dúvida.
Segunda: o que significa ficar “vigilante”? Vigiar os juízes, montar vigílias nas
 praças? Terceira dúvida: de que maneira estudantes e movimentos sociais 
garantem um “julgamento nos autos”, dando lições de direito constitucional
 e penal aos magistrados?
Quarta e última dúvida: em que momento Dirceu ouviu “a voz do 
monopólio da mídia” defendendo a condenação?
Como não apontou casos específicos, cabe a pergunta genérica, pois no
 geral o que se tem visto e ouvido é a defesa do julgamento ao 
tempo próprio. Seis anos depois de oferecida a denúncia.
José Dirceu pode dizer o que quiser e, dentro das balizas legais, fazer
 o que bem entender em sua defesa. Só não pode pretender fazê-lo sem
 contraditório.
Pode até mesmo acreditar que as massas tomem as ruas em prol de sua 
absolvição, embora pareça inútil, pois as massas andam amorfas.

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